sábado, 1 de maio de 2010

Ana Merij

_ ROGATÓRIO _


daí-me, senhor:

qualquer fatia de tempo sem uivos, sem gemidos

uma parte de alma que me falta, arrancada no grito

dái-me o credo como ungüento para essa minha fé rasgada

e o poente, senhor, para os joelhos vergados na hora sacra



daí-me, senhor:

uma tarde plena de borboletas lépidas e serenas

dai-me a palavra desnuda de iniqüidades e da dor

semeia, senhor, no meu olhar a quietude de lírios dos campos



livrai-me, suplico, do clamor dos inocentes e dos proscritos

do azeite e do vinho vertidos nas catedrais da ignomínia

dai-me o desmemoriar das epistolas flácidas dos sacerdotes

de oficio pirotécnico, carnavalesco e ensandecido



poupai-me, senhor,

da miséria dos desprezíveis

do ventre prenhe da menina de rua

dos maltrapilhos amontoados nos albergues e abrigos

das mães da sé chorando seus filhos

do lixo-homem queimando nas calçadas

de todas as izabelas agonizantes nos meus dias



para minha memória, dai-me senhor

as letras do mais absoluto esquecimento
e, um qualquer milagre:
                                         [- preciso!]

anamerij

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