sábado, 1 de maio de 2010

Crônica de Affonso Romano de Sant'Anna e Concurso Cultural


 ALPHONSUS, LUCIANA ENTRE OUTROS

Vários amigos se foram nesses dias. Os jornais noticiaram alguns mais conspícuos, como o ator Fernando Torres, o homem de televisão Fernando Barbosa Lima, o jornalista Fausto Wolf. Nessa leva foi até cantor kitsch assumido Waldick Soriano e a figura mais presente em todos os filmes brasileiros- Ruy Polonah: estava sempre fazendo pontas, papéis secundários, mas nem por isto deixava de ser uma boa figura.
 
Mas duas outras figuras queridas também partiram- Alphonsus Guimarães Filho e Luciana Stegagno Picchio. Como costumo dizer, o lado de lá está ficando mais interessante que o de cá. Quando Affonso Henriques Neto me ligou comunicando a morte do pai, pusemo-nos a lembrar vários fatos, inclusive uma histórica viagem e um recital tri-geracinal, lá em Mariana, na casa de seu avô Alphonsus de Guimaraens.

 Abro os poemas do "Alphonsinho" como o chamavam Bandeira e Drummond e dou com este texto:

 Fala do Defenestrado



Se a vida me sujou, nada me resta

senão defenestrar-me. Defenestro-me.



Antes, no entanto, há que dizer a alguém

(a ti, leitor?) do que ficou denso,



de intangível, num ser desmantelado.

Antes, no entanto, há que comer num prato



que em dezenas de anos vim compondo

de carnes, cereais, de ervas e sonho.



Sei que hão de lembrar-me por agora.

Mas me empolga a emoção deliciosa



de quedar-me esquecido- musgo e pedra.

É a vida ou é a morte que me defenestra?"

Conheci Luciana Stegagno Picchio no final dos anos 60 quando me encontrei com Murilo Mendes a primeira vez em Roma. Ela e ele eram (e serão sempre) duas grandes referências quanto ao ensino da literatura brasileira na Itália. Felizmente Brasil e Portugal prestaram a Luciana, ainda viva, todas as homenagens possíveis. Até eu, quando dirigi a Biblioteca Nacional, lhe enviei uma medalha da instituição. Sua casa na Via Civitavecchia,7 - era um pouso obrigatório dos intelectuais brasileiros. Alguns, como Alexandre Eulálio e Celso Cunha, chegaram até a residir ali algum tempo, pois na casa havia sempre um quarto para escritores-hóspedes.

 Numa das vezes em que esteve em minha casa, foi num jantar memorável com José Saramago, Lidia Jorge e Carlos Reis. Pedi-lhe que repetisse algumas de suas estórias, como aquela em que durante Segunda Guerra Mundial, enquanto os aviões bombardeavam a cidade, seu pai reunia os filhos debaixo da escada para ler para eles a "Divina Comédia".

 Narrava ela que seu pai abrigou, imaginem, o tresloucado Ezra Pound em sua casa, quando este estava sendo procurado pela polícia. Depois de adulta, foi visitar Pound, acompanhada de Murilo Mendes.Foi uma cena desagradável. Pound nem olhou para a cara de Murilo, e continuou conversando com um jornalista americano. Por isto, talvez um pouco ressentida, mas com certo humor ela dizia:

 - Não sei por que vocês no Brasil têm mania de Ezra Pound.

 -Essa mania já passou, tranquilizei-a.

 Como se vê, tudo passa. E para além das pessoas, permanece a poesia.

Affonso Romano de Sant'Anna

  
Concurso Cultural – novas datas

QUE PAIS É ESTE?

Blog:



Por causa do sucesso do Concurso Cultural, prorrogado o prazo para envio das frases de 140 caracteres com as respostas para “Que País é este?”.


As datas agora são:

14/5 – último dia para envio da frase
31/5 – resultado do concurso

Participem!

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