sábado, 3 de julho de 2010

AMOR DIVINO



Eu sei que me amaste no brilho das coisas simples

como o verde da árvore, a seda dos crepúsculos,

a água-mater das mãos recolhendo a coloração dos frutos

porque, sei-o hoje, se me amasses rubi ou esmeralda

o amor reluziria na tremura dos teus dedos.

Agora, eu sei que me amas como se fosse uma deusa

inalcançável detendo o fogo dum raio de luz

e, ainda, que doendo a renúncia desse fogo

continuas a amar-me na minha imortalidade de mortal.

Eu também sei que numa rosa encarnada

sentes o perfume dos meus cabelos e me chamas

deusa em movimento, mutilada num alvoroço de

pregas esvoaçantes e asas aladas.

Ainda sei que me amas na figura de Florbela

quando no parque dos poetas a solidão te encontra

e a beijas tocando-lhe a face de pedra

sonhando o teu toque na carne viva do meu corpo.

Eu sei que me amas na distância dos barcos

indagando o amor na alvura das velas.

Eu sei que o milagre dos meus beijos perdura na dor

dos dias e das noites que separam o nosso tempo…

mas, amor, eles perdem-se pelos prados, avenidas e estradas

e são somente flores abstractas e desfolhadas.

Fica tão longe o meu corpo de ti que somente o sol

se compadece e sente o seu riso no cântico das sereias

e sob o seu encantamento reténs o mar nas mãos

embalando sonhos onde moram as areias.

Meu amor, o mar é negro no rio do inverno

e meu olhar é uma nuvem enclausurada no longe…

Ah! Mas eu sei que me queres a teu lado pelo brilho das estrelas

porque nelas vês o meu corpo num cálice de fulgor divino

ainda que te doa o silêncio de névoa nas janelas.

É então que tua mão traça sobre as saudades do corpo

a poesia de W. H. Auden “Tu és o meu Norte, o meu Sul

O meu Leste e o meu Oeste (…).



Bernardete Costa

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